domingo, 9 de maio de 2010

uma história

Impiedosos são os pensamentos durante a interminável solidão. A inquietude do silêncio. A brancura do nada. Os detalhes escondidos no cotidiano. O tic-tac... os vincos das rachaduras, as manchas na pintura velha da fria sala mal iluminada. Quanta lasciva, quanto pecado em querer... em sentir. Todo despudor de desejar.


Ela parecia decorar cada defeito da sala gelada. Os cantos encardidos, azulejos mal lavados, pintura descascada por uma infiltração esquecida. Enquanto esperava, mordia as bochechas e os lábios, apertava-os contra os dentes e tirava o esmalte com as unhas dos polegares. Apesar de tudo, seus gestos eram impressionantemente despreocupados.


Fora da sala ouvem-se passos apressados e discursos confusos, muitos cochichos abafados. Um apinhar de curiosos e jornalistas disputam o melhor espaço em frente ao prédio da polícia. O som dos flash’s parece um cavalgar de gafanhotos.


A notícia se espalhara como uma grande nuvem negra. Algo que seria quase inacreditável... inaceitável. Vozes sussurradas a condenavam enquanto a noite avançava gelada pelos corredores. Tudo lhe parecia estranho, menos o gosto de sangue em sua língua... (continua)



sexta-feira, 7 de maio de 2010

NOSTALGIA

Hoje estive sentado por horas em minha cozinha. Olhei os “azulejos” brancos, cadenciados e bonitos. Um bonsai sobre o microondas amarelado e a louça suja enfeitando a pia. Pela grande janela, sem cortinas, o sol iluminava todo o ambiente e um vento frio entrava sorrateiro pra me tocar.

Pensei em muitas coisas. Senti um perfume gelado de passado. A nostalgia me visitava sem pressa. Quis ter um amigo pra conversar naquele momento. Não era a tristeza, mas um gosto agridoce de saudade e complacência que me fazia sentir solidão.

“Quero me deitar em um campo verde. Sentir o cheiro de manhãs de sábado. O perfume do primeiro dia de férias escolares. A sensação de ser olhado pela menina mais linda do colégio. O gosto estranho do primeiro beijo. O sim.”

Caminhei até a rua e contemplei a imensidão azul, a plenitude respirada em poesias. Olhei para o gramado e para o horizonte plano visto da minha calçada. “Um dia vou tocar as mãos geladas do meu amor e segurá-las com a calma de quem espera a chuva”

Lembrei que vivi todos os meus dias e nada voltará. Não seria o momento próprio para buscar os sabores de arrependimento. “Amanhã , se houver amanhã, a claridade entrará pela grande janela da minha cozinha e continuará... e continuará...

“Não sou santo” (meu caro leitor) Não espere heroísmos. Alguém, certa vez, me disse que jamais havia conhecido qualquer pessoa que fosse tão cruel, mentirosa e desprezível quando a mim. Não espere decência nas minhas palavras ou humanidade nos meus gestos... “não gosto do que não gosto”... adeus



todos tem segredos

todos têm fantasias...